sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

PARQUE TEÓFILO DANTAS (II)

O Parque era uma área ecológica e urbanisticamente preservada, pois, normas municipais proibiam até as pessoas espocarem foguetes   nos dias festivos, para que não fossem danificados os globos de vidro da iluminação pública e outros equipamentos, segundo a previsão do Edital Nº 5, publicado no Diário Oficial do Estado, edição do dia 20 de agosto de 1928.
       Outra providencia com vistas à manutenção das árvores em crescimento e ao aformoseamento dos jardins que decoravam as suas alamedas, foi a transferência da Feirinha de Natal para a Praça Pinheiro Machado, atual Praça Tobias Barreto, na Zona Sul da Cidade, o que aconteceu em decorrência do Edital Nº 49, publicado na edição de 18 de dezembro de 1929, no Diário Oficial do Estado, que também, publicava os atos municipais.
       Então, na Praça Pinheiro Machado, logradouro aracajuano que homenageava  José Gomes Pinheiro Machado (1851-1915), o político gaúcho mais influente da República Velha (1889-1930), –passaram a ser realizadas, por uns vinte anos, as festas de Natal, Ano Bom e Reis, que ficaram imortalizadas nas páginas do livro Roteiro de Aracaju, de autoria do poeta, cronista, romancista, jurista, professor e acadêmico Mário de Araújo Cabral, um dos fundadores da Academia Sergipana de Letras.
       Mas, nos anos de 1950, a Feirinha de Natal voltou a pontificar no Parque Teófilo Dantas, concentrando nesse espaço público da cidade, total congraçamento religioso e profano da cidade. Nessa época, o ciclo natalino, iniciava-se, invariavelmente, no dia 8 de dezembro, logo após a procissão de Nossa Senhora da Conceição, encerrando-se no dia 6 de janeiro, data dedicada aos Reis Magos, na tradição cristã.
       Durante esse período eram instalados os equipamentos de lazer para a alegria do povo. Um dos que mais atraíam a criançada era o Carrossel de Seu Tobias, capitaneado por um boneco negro, que tocava um realejo e com efeitos mecânicos, movimentava a sua cabeça. O realejo foi substituído por um estridente apito, que era ouvido a alguns quarteirões, pois à época não havia poluição sonora. Este Carrossel era um produto norte americano, fabricado em North Tonawanda, cidade do estado de Nova York e classificado como equipamento de entretenimento, já conhecido dos sergipanos desde 1904, porém, só depois de 1958, quando passou a pertencer ao Vereador Milton Santos, consolidou-se como garantia das festas do Natal de Aracaju. Era instalado no lado direito da Catedral Nossa Senhora da Conceição e composto com parelhas de cavalos de madeira, pintados com tinta a óleo, à semelhança das cores dos eqüinos (tordilho, ruço, preto, alasão, castanho),  encilhados  e, também, movimentados mecanicamente, como se estivessem a galope.  Era a sensação de crianças e adultos, que ainda se aboletavam nas confortáveis poltronas, a rodopiar numa plataforma sobre trilhos e alaridos festivos, que só cessavam quando eram iniciados os ofícios religiosos. No mesmo lado, havia outros brinquedos, tipo Avião, Sombrinha, Barcos que eram verdadeiros balanços, puxados com cordas, além da Onda de madeira. Em frente a esses equipamentos havia um balcão de madeira revestido com folha de flandre, onde estava a banca de Seu João do Cachorro Quente, o sanduíche mais famoso do Parque, cozinhado numa panela de alumínio reluzente, cujo aroma da iguaria invadia o ambiente, atraindo os seus consumidores. Entre um Cachorro Quente e outro, os mais gulosos ainda degustavam pipocas.
       Em frente à Igreja, descortinava-se um corredor, a que o povo chamava de Quem me quer, pelo fato de que as adolescentes ficavam prá lá e prá cá, exibindo-se para a rapaziada, que se concentrava, praticamente, no entorno da estátua  do Monsenhor Olímpio Campos. A cada lado desse corredor, algumas famílias burguesas colocavam bancos de madeira com os seus respectivos nomes, e até poltronas, para acompanharem as suas filhas, tempo  em que, as mulheres tinham uma oportunidade de ficarem tricotando a vida  alheia. Nas imediações desse espaço eram instalados bares com mesas e cadeiras, tanto em frente à Escola Normal, hoje Centro de Turismo, como  na parte superior do antigo Aquário, atual Galeria de Artes Álvaro Santos e na parte fronteiriça da Prefeitura e do Palácio Episcopal, destacando-se, pela fidalguia no trato com os seus clientes, o Bar do Cotinguiba Sport Clube, gerenciado por Roger Torres de Oliveira.
       No outro lado da Igreja, ou seja, no lado esquerdo desse monumento histórico,  encontrávamos a Roda Gigante, os tabuleiros de arroz doce, de confeitos de castanha e de amendoins acondicionados nos barquinhos de papel de seda, de roletes de cana, de maçã do amor, de cavaco chinês, além do vendedor  de balões (bexigas) com o seu cilindro de gás hélio, que deslumbrava meninos e meninas. Misturados a tudo isso, havia também as barracas para as pescarias, de tiro ao alvo, de argolas e as bancas de jogo, tipo barrufo, pio (dados), jogo do bicho e, mais ao fundo, roletas. O jogo de azar era livre, apesar da sua proibição por força do Decreto-Lei 9.215, de 30 de abril de 1946, assinado pelo Presidente Eurico Gaspar Dutra. Nessa mesma área havia um palanque para a apresentação de folguedos folclóricos, entre os quais se destacavam a Zabumba de Quemdera, o Reisado de Piliu, a Chegança de Zé do Pão e o Guerreiro de Mestre Euclides. Ali também estavam instaladas as toscas barracas  de pano, que formava um conjunto de bares e de pequenos restaurantes, popularmente chamado de Egito.  


       Nos bares do Egito eram servidos apetitosos pratos típicos, entre os quais caruru, sarapatel, sopa de mão de vaca, pirão de mocotó, carne de porco frita, com fígado e rins de boi, feijoada, galinha cozida (kitchen) e galinha ao molho pardo, tudo regado a cerveja e cachaça, em especial a Guiamum, Paraty, Fogosa, John Bull, entre outras marcas. Esses estabelecimentos pertenciam a pequenos empresários, geralmente da periferia, da Caixa d’Água, da Suissa e de outros lugares afastados, cujas famílias de baixa renda se mudavam para o Parque nesses dias festivos. Naquelas barracas, alimentos, gente dormindo, barricão com cerveja gelando com pedaços de barra de gelo enrolados em jornais velhos acondicionados com pó de serra e sal grosso, já que não havia geladeira, nem freezer, compunham o ambiente e a sua higienização. Os pratos eram de ágata, alguns dos quais já com as beiras sem esmalte; os copos de vidro, tipo americano, eram lavados nas bacias de alumínio, tudo para atender à clientela composta de notívagos e de jogadores das roletas, que, entre uma aposta e outra, degustavam esses deliciosos acepipes, até alta madrugada.   

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